Como a Alta Liderança influencia (ou pode influenciar) o comportamento de cuidado de seus líderes diretos?
Que os direcionamentos que vêm da cúpula da empresa dão o tom e o ritmo dos movimentos nos outros níveis, todo mundo já sabe. O que sempre me chama a atenção é um eventual excesso de importância que se dá ao discurso (o tal do “recado") e uma menor atenção que se presta à forma como este discurso é performado entre uma reunião de líderes e outra.
É incrível como, mesmo nos mais altos níveis de liderança onde estão as pessoas mais bem formadas e preparadas da empresa, ainda se pode notar a persistência de antigos paradigmas sobre motivação, visão pouco sistêmica sobre resultado, baixa percepção sobre como seu comportamento impacta os comportamentos de toda a rede. E já pude observar algo que me deixa ainda mais intrigada: em muitas realidades organizacionais, a forma como uma diretoria cobra resultados de seus liderados parece ser um dos fatores que os enfraquecem na busca por este mesmo resultado. Ciclo vicioso? Parece que sim.
Vamos por partes:
Empurra e puxa? Pressiona ou impulsiona?
O tempo da punição e recompensa como única forma de fazer alguém se mover na direção de um objetivo já passou. Hoje compreendemos muito melhor o que engaja, compromete e impulsiona as pessoas na direção do que lhes parece importante. Muitas das estratégias clássicas de "pressão por resultado" já se mostram desgastadas, menos eficientes e mais, as do tipo punitivas podem vir acompanhadas de efeitos colaterais nada desejáveis como sentimento de injustiça, configurações de assédio no trabalho, riscos de impacto em saúde mental e perda de talentos.
E se um@ executiv@ investir em ajudar o seu time a conectar a responsabilidade de entregar o resultado com o sentido e o propósito do que vocês estão construindo e, também, perguntar para eles como eles precisam ser apoiados por ele/ela para que possam alcançar os resultados que precisam? O que mudaria?
Cobra mas não patrocina? Pressão para atravessar o mar sem barco nem remo pode resultar em afogamento.
Cobrar com firmeza talvez seja uma das ações mais comuns na vida de alguém que está em cargo executivo. Compreensível. Há momentos críticos nos quais assumir esta postura é exatamente o que precisa ser feito. É preciso manter o pessoal focado no resultado", dizem. Mas me pergunto: "e o que mais? já parou para pensar que pressionar o time é bem diferente de patrocinar sua performance?"
Patrocinar é uma gíria corporativa que se refere a dar suporte, fornecer recursos, acompanhar o andamento, articular e garantir suporte de outras áreas e de outros líderes para os projetos do seu time, se sentir e fazer parte do desafio, ser porta-voz, oferecer apoio aos seus diretos para que eles confiem em você para que possam trabalhar em conjunto pelo resultado.
Acredite: um dos sonhos que ouço da boca de quem está investindo tempo e energia para fazer o sistema produtivo girar bem e que está no meio da hierarquia de liderança (gerência, coordenação, supervisão) é ser mais bem patrocinado por seus líderes superiores para que seja mais possível entregar os resultados pelos quais são responsáveis e também cobrados.
Neste ponto compartilho aqui uma pergunta que fica me provocando internamente quando me deparo com um cenário de resultados ruins, especialmente em saúde e segurança:
"E se o resultado ruim da sua diretoria não for somente fruto da “falta de comprometimento” do seu time, mas também, fruto de excesso de pressão e de falta de patrocínio da sua parte?" A pensar.
Batemos record de produção... mas...infelizmente...tivemos duas fatalidades!
O resultado final não está desvinculado da forma como ele foi gerado.
Produzir é um processo. Complexo.
Resultado de produção e financeiro é “o que” fazemos. Tem game over. Saúde, segurança, sustentabilidade, ética é o “como” fazemos este resultado acontecer. Não tem game over.
Há um tipo de mentalidade (uma forma de olhar e agir no mundo) que talvez seja um dos mais básicos, porém maiores, obstáculos ao fortalecimento da Cultura de Segurança de uma empresa hoje: a força que o pensamento linear, binário, segmentado ainda tem. Por debaixo dos discursos e direcionamentos vindos de cima como “segurança é nosso valor” feitos aos gestores, está um tom subentendido que poderíamos resumir em: “nosso resultado de produção é ao que realmente precisamos nos dedicar e, de preferência, sem acidentes. Mas se acontecer vamos ter que tratar, faz parte do business".
Isso não é verbalizado, mas é percebido por muita gente ali. E pode estar aí um dos grandes nós do círculo vicioso. A gente nomeia a vida como valor mas a gente sabe que, no "vamos ver", o valor real mesmo a ser perseguido é o resultado financeiro.
Perseguir resultado financeiro é um problema? Não. As indústrias existem para produzir. A questão é "como elas produzem o que produzem". Quantas vidas são negativamente impactadas pelo desequilíbrio entre "o que fazemos" e o "como fazemos".
O convite que tenho feito a estes executivos “focados em resultado” é: se cuidado com a vida das pessoas é um compromisso assumido nesta empresa, que tal a gente se provocar a pensar de que forma podemos conectar mais e melhor o cuidado com o resultado?
Penso que se as pautas e compromissos ESG estão se tornando estratégicos para seu negócio, precisam se tornar incorporados na tua forma de dar direção e ritmo para as pessoas que respondem para você. Do contrário seguiremos amplificando a distância entre o que dizemos e a forma como jogamos o jogão da gestão.
E sabe o que é mais curioso e interessante? Quando um@ executiv@ se desenvolve a ponto de diminuir a distância entre suas palavras e seus comportamentos e isto se torna visível para seu time, o resultado é o surgimento de uma moeda que está em alta cotação hoje em dia e todo mundo está querendo: confiança.
Todos já sabemos que confiança é base para performance e resultados sustentáveis a longo prazo em diferentes direções.
Na minha modesta perspectiva de observadora destes fenômenos no mundo industrial por 24 anos, a maior barreira que pessoas em posições de Liderança podem enfrentar no esforço de construir confiança com seu time é: estar inconsciente e indiferente da sua própria incoerência.
📗Para quem quiser ler mais sobre isso, recomendo 3 livros:
- "Jogo Infinito" do Simon Sinek
- "A coragem para liderar" da Brené Brown
- "Todos são importantes" de Bob Chapman e Raj Sisodia